sábado, 11 de julho de 2015

TÃO BONITA ASSIM, NÃO PODE SER INTELIGENTE. O MITO DO FÚTIL AO REDOR DE MARILYN MONROE

Uma mulher culta? Leitora voraz? Escritora? 
Mas não era um símbolo sexual? Só um bichinho bonito?

Com 36 anos de idade Marilyn estava tão cansada disso que morreu. Os problemas de Norma Jean (seu verdadeiro nome) sempre foram muito sérios, mas o problema maior talvez seja o fato de que nunca a tenham levado a sério, como muitos fazem até hoje.

Nem todo mundo que cercava Marilyn era ruim, mas no geral, ela esteve desde muito nova, atirada a um ninho de cobras, tentando abrir caminho por um mundo masculino. Sempre com o peso de provar que não era só isso, que não eram só aquilo, que era uma atriz e não só a moça bonita que fazia charme para as câmeras. E ouviu tantas barbaridades, até mesmo das pessoas que escolheu para amar, que não sabia mais como colocar a si mesma nesse mundo cruel, duvidava de si, insegura, estava perdida e sorria como quem se desculpa.
E quem poderia culpar alguém na posição dela por perder a fé em si, quando afinal é conhecido de todos, é muito mais fácil acreditar nas coisas ruins que ouvimos, do que nas boas.
Mas ainda hoje se pergunta, como um grande mistério: de que ela morreu? Ela tinha tudo, por que se mataria? E dizem muita coisa, como fraqueza, fragilidade e principalmente futilidade... Já que também, é outra coisa conhecida, que quem morre deve uma explicação pra quem fica não se pode simplesmente morrer, principalmente alguém como Marilyn.
Passando os olhos pela história de Marilyn, tem-se a impressão de que dela devia se sentir muito especial, sempre ouvindo elogios e sendo admirada, mas não era bem assim, pelo menos não eram assim que ela se sentia.
Ela mesma disse: Ninguém nunca disse que eu era bonita quando pequena. Toda menina deveria ser chamada de bonita, mesmo se elas não sejam.
Marilyn nasceu como Norma Jeane, em 01 de junho de 1926, em Los Angeles. Sua mãe era uma doente mental. No curto período que passou ao lado da menina, numa casinha com um piano branco que ela deu a Norma Jeane, ela estava em pânico; acreditava que indivíduos hostis iam irromper pela casa e levar tudo embora.
Pelo menos dois abusos sexuais são conhecidos dos biógrafos de Marilyn, um sofrido aos 7 anos e o outro aos 11. Em ambos, ela foi vítima de integrantes mais velhos das famílias adotivas com as quais conviveu. Confiar e construir relacionamentos nunca seria o forte de Marilyn. No fim, ela viveu com onze famílias diferentes. E depois de tudo, talvez ela tivesse quase a certeza de que seus amados a machucariam, ou iriam embora.
Não era simplesmente esquecer tudo isso e ser Marilyn, apenas Marilyn. Ela disse: Marilyn só existe nas telas, fora delas sou Norma Jeane.
Sou do interior.
Norma Jeane se casou aos 16 anos com seu primeiro marido, Dougherty, que a traiu logo em seguida. E após isso, ela datilografa páginas de reflexão sobre o caso, que só poderia ter vindo de uma mente perspicaz, de uma cabeça pensante, muito madura para a idade.
Os homens não me veem, apenas me olham, disse ao psicanalista, já perto do fim de sua vida.
Seus problemas sempre foram muito sérios, ainda assim, era frenquentemente acusada por diretores e colegas de trabalho, como John Huston, que a dirigiu em “The Misfits”, de ser uma neurótica suicida, uma vadia. Foi chamada de fresca nos sets de filmagem quando estava muito doente. Tentava fazer o que amava e esbarrava na frieza do mundo de negócios, nas pessoas tantas em quem não podia confiar na falta de amor.
O livro “Fragmentos – Poemas, anotações íntimas e cartas de Marilyn Monroe”, lançado no Brasil pela Tordesilhas 2011, reúne as anotações e os poemas de Marilyn. Ela costumava escrever em qualquer pedaço de papel que achasse pela frente, guardanapos avulsos, cadernetas e agendas, que enchia com suas angústias.
E ela diz:
Socorro, socorro. Socorro. Sinto que a vida está chegando mais perto quando tudo o que quero É morrer.
A descrição do livro começa da seguinte forma: “Pouca gente sabe, mas a atriz norte-americana Marilyn Monroe, símbolo universal de beleza e sensualidade, era uma leitora ávida...”
Ela chegou a mostrar alguns de seus textos apenas para amigos muito íntimos, e chegou a ser aconselhada a escrever mais, quem sabe um livro. Após sua morte, em 1962, tudo que escreveu foi deixado ao seu amigo Lee Strasberg. Quando ele morreu, em 1982, a herança parou nas mãos de Anna Strasberg, sua esposa, que buscou os organizadores para ajudá-la a dar um destino ao material.
Ao pegar o livro na minha estante alguém disse: Ela escrevia? Achei que era só um bichinho bonito.
O vendedor na livraria disse: Você acredita mesmo que ela lia? Pra mim ela era uma poser com todos esses livros na mão. James Joyce? Duvido.
Marilyn buscava uma verdade, algo de bom no mundo, apesar das decepções, queria ser realista: "É melhor conhecer a realidade ou as coisas como são que não conhecer e é bom ter o mínimo possível de ilusões"
Marilyn se frustrou se anestesiou, se dopou e exagerou. A conclusão da causa de sua morte foi suicídio.
Oh droga queria estar morta – absolutamente inexistente desaparecida daqui – de todos os lugares, mas como eu conseguiria Sempre existem pontes...
Marilyn estava em evidência, em tempos ainda muito difíceis para as mulheres, anterior à queima dos sutiãs de 1968, anterior a muita coisa e se sentia extremamente só.
Sozinha. Eu estou sozinha. Eu estou sempre sozinha não importa o que aconteça.
Mas sem dúvida ela não foi a única a ser tachada por homens como histérica, neurótica, ou vadia, apenas por ser dona de uma beleza exuberante, ou burra, pelo mesmo motivo. Tão bonita assim, não pode ser inteligente. Quem nunca ouviu isso? Ouvimos muito até hoje, se não somos mais tachadas especificamente como inferiores aos homens, ainda somos como fúteis compradoras de sapatos, fragilizadas e sentimentais, propensas a rompantes e crises, menos eficientes. Todas ainda sujeitas ao mito do fútil.
Precisamos nos desmitificar como muitos tentaram, lealmente, desmitificar Norma Jeane do mito do fútil e dar a ela a justiça de poder sofrer, estar doente, sentir medo, ser humana apesar de ser Marilyn.
Como ela escreveu: Para a vida É uma determinação e tanto não me sentir sufocada.

E ainda lhe devemos o crédito, de apesar de tudo isso, ter conseguido o que conseguiu nas telas, como eles costumavam dizer: quando Marilyn acertava a cena, você não queria olhar pra ninguém mais.