terça-feira, 9 de outubro de 2012

Geração Rivotril



   Essa e a era dos depressivos? Rápido. Muito rápido. Na maior velocidade possível. Menos que isso e entramos em colapso. A Era da Informação é uma máscara bem fina. Tornamo-nos mesmo a Geração Rivotril na Era da Depressão. Por quê? Talvez não haja tempo para explicar. Sucintamente: não temos tempo nem para ser felizes e nem para sofrer em paz.
   A tecnologia nos cosome, um minuto que preciso checar o celular. Desce mais uma pílula, por favor. Tarja preta, claro, não tenho tempo para florais, está louco? Ah, manda um uísque também. Gelo. Se puder ser um Black, agradeço.
   Só mais um minuto: alguém me escreveu algo importante.
  Algo dói aqui.
  Não há que ser nada. Se paro e fico pensando posso estar perdendo tantas coisas. Aquele vídeo é fundamental para mim. Imagina eu ser o único que não soube disso amanhã. Mas e essas minhas mazelas pessoais me atrapalhando?
Tanta dor. Tanta confusão.
   Sim, vidas pessoais sempre foram, no mínimo, caóticas. Desde os primórdios. Ou alguém se esqueceu do nosso histórico de selvagens – mudança sutil aqui, não? Mas voltando ao tópico que o tempo é bem curto, a diferença fundamental era o tempo para lidar com as calamidades do dia-a-dia. Para digeri-las. Para até tentar entendê-las.
    Hoje estamos nesse turbilhão de dados que nos envolvem tanto quanto nossas peles. Arbitramos prioridades. O peso dessas escolhas nos sufoca. A depressão é cada vez mais natural. E haja química para suportar tanta coação mundana. A tela mágica desfila seu celeiro de felicidade impossível, vidas incríveis e corpos perfeitos. Enquanto nos vemos mergulhados em areia movediça. Sequer notamos, na verdade. Nossos sentidos estão em frangalhos, mas continuamente antenados nas frivolidades das redes. Sociais? Ou antissociais? Tanto faz uma vez que nos encapsulam como presas à espera da aranha algoz.
   Vodka no copo que eu quero esquecer a semana. Deveríamos nos orgulhar de nossos feitos, mas chegou mais uma Segunda-Feira. Maldita seja. O amor pode esperar. Preciso dar uma checada nos meus contatos. Vai que rola alguma coisa. Sempre na tela. Sempre muito rápido. E esses e-mails dos infernos. Brotam incessantemente. Mas e aquele assunto mal resolvido com aquela pessoa? Na hora eu vejo. Penso rápido. Análise superficial – como todo o resto. E tome essa resposta frívola e mal elaborada. É tudo que tenho a oferecer.
Não tem jeito, uma hora a maldita cabeça há que pousar em um travesseiro qualquer. E o cérebro imparável vai cobrar respostas. Mas se sequer temos perguntas bem resolvidas como elaborar saídas. Vemo-nos perdidos e não há nesse mundo um GPS bom o suficiente para nos guiar na estrada rumo à morte. Sim, a morte está logo ali à espreita. Inexorável. O beco parece sem saída. E padecemos de pé. Padecemos quando despertamos. Estamos com tudo. Temos tudo. Acessamos tudo. No entanto, estamos completamente vazios no fim.
   Imaculados seremos no fim. Pois lá no final do arco-íris não há nada. Nenhum pote de ouro. Mas nenhuma cobrança. Nenhuma informação perdida. Nenhuma dor.
   Esperamos morrer para entender o quanto nos dedicamos à forma, ao estilo, ao jeito e não às pessoas. Não às relações. Não à nossa história. Escrevemos tanto e não deixamos nada escrito de fato. Lemos tanto e não agregamos nada. Não absorvemos nada útil. Mas o que é utilidade se são as futilidades que hoje nos interessam mais? É isso aí. É o que temos para esperar até a hora do próximo comprimido.
   Um copo d’água, por favor.
  Que nossos sentidos se agucem para nós mesmos. Que nossos desejos se direcionem às nossas aflições e angústias. Que no fim, no apagar das luzes, alguém possa contar algo sobre nós. Ou que mesmo que ninguém faça isso, existam marcas eternas em outras pessoas. Isso não significa marcas boas, felizes, venturosas. Cicatrizes na alma, isso, sim!
   Afinal, sentir é tudo que somos. Ao fechar os olhos e nos isolar do resto, é só o que há. Uma alma em curto, buscando um sentido nos lugares errados. Nas telas acesas por aí. Que sintamos mais e que sintamos melhor. Sofrer, sim. Sofrer, sempre. Aprender. Errar. Aprender. Errar. Isso mesmo. Nenhum acerto esperado. Mas muita garra ao tentar.
   O dia seguinte é inevitável se continuamos vivos. Bom se estivéssemos em um maldito feudo podendo nos dedicar aos mexericos da vila e mais ainda às dores de nossas almas. Àquela pessoa que insiste em não nos querer. Às vezes em mesmo ignorar nossa existência. Uma vida para pensar sobre esse todo tão minúsculo, mas tão maior que esse todo gigantesco que acreditamos ter hoje.
  Voltemos ao século dezesseis. Que encontremos um alquimista que nos forneça o Rivotril da época. Mesmo que seja um copo de um alcoólico qualquer vindo da abadia mais próxima. Se só os frades puderem ajudar, que assim seja.
   Contudo aqui estamos frente aos monitores. Aqui estamos em frente à tanta coisa. Tanta coisa que esconde nossos objetos realmente importantes. Cuidemos de uma a uma nos segundos que lhes cabem. Um salve ao Rivotril nosso de cada dia. Ao copo do drinque mais forte. Às pessoas insensíveis como nós mesmos. Misturemo-nos e mergulhemos juntos nesse caldo insosso produzido por essa epopeia dolorosa e sem sentido.
   Adeus, é preciso assistir aquele vídeo para ter assunto amanhã no café.

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